Em todas as sociedades humanas complexas existe dominação de uma
classe sobre a outra. Os terráqueos vivem, invariavelmente, sob o julgo de algum
império. A elite sempre se beneficia e tira vantagem. Em todas as sociedades
prevalece uma ordem ideológica, econômica e política, em que uma classe dominante
exerce forte controle sobre o conjunto da sociedade, funcionando como base dos
poderes estabelecidos. Existe sempre, de um lado a burguesia, aristocracia, ricos,
poderosos, enfim, a elite, que é fechada a inovações e avessa ao compartilhamento
do poder e que, portanto, quer conservar as coisas como estão e do outro lado, os
oprimidos que querem mudar isso. As estruturas que foram formadas dividiram as
pessoas em pretensos grupos, dispostos em uma hierarquia. Os níveis superiores
desfrutavam de privilégios e poder, enquanto os inferiores sofriam discriminação e
opressão. “Os superiores ficavam com todas as coisas boas da vida. Os homens
comuns ficavam com o que sobrava. Os escravos ficavam com uma surra, se
reclamassem”. (HARARI. 2015. p. 141). Isso consagrou a hierarquia entre ricos e
pobres.
Para Harari “muitos que viam a hierarquia dos homens livres e dos
escravos como natural e correta argumentaram que a escravidão não é uma
invenção humana” (2015 p 142). Para muitos era algo fruto da providência
divina. Aristóteles afirmou que “os escravos tinham uma ‘natureza escrava’,
enquanto os homens livres tinham uma natureza ‘livre’. Seu status na
sociedade não passava de um reflexo de sua natureza inata” (Harari. 2015, p
142)
Harari lembra que para um capitalista a hierarquia da riqueza é o
resultado inevitável de diferenças objetivas na capacidade dos indivíduos. Ou
seja, os ricos têm mais dinheiro porque são mais capazes e aplicados.
Consequentemente, como recompensa pelo esforço têm melhor serviço de
saúde, melhor educação e melhor nutrição, melhor moradia e acesso a tudo
que precise ou queira, ad infinitum. (HARARI. 2015). Eles são merecedores de
todos os benefícios de que desfrutam e ninguém deveria se incomodar com
isso! A pessoa é alimentada desde cedo com estes discursos e acredita, e tem
estes mitos como sendo verdade.
Mitos fazem acreditar que existem os muito indisciplinados e
irresponsáveis e, do outro os autodisciplinados e responsáveis. As pessoas são
ensinadas a crer que a hierarquia de ricos e pobres, que autoriza os ricos a
viver em bairros luxuosos, estudar em escolas de qualidade e ter acesso à
saúde, é perfeitamente justa. Mas é um fato comprovado que a maior parte dos
ricos são ricos pelo simples motivo de terem nascido em uma família rica,
enquanto a maior parte dos pobres continuarão pobres no decorrer da vida
simplesmente por terem nascido em uma família pobre. (HARARI. 2015)
Paulo Freire fala disso como “um processo que passa de geração a
geração de opressores, que se vão fazendo legatários dela e formando-se num clima
geral que cria nos opressores uma consciência fortemente possessiva do mundo e dos
homens”. (FREIRE. 1996, p.44)
A elite disseminou a ideia de que a natureza recompensa o mérito com
riqueza, e penaliza a indolência com a pobreza. Fez acreditar que a distinção entre
homens livres e escravos, brancos e negros, ricos e pobres é natural e inevitável.
Aliás, toda hierarquia afirma ser natural e inevitável.
FREIRE, Paulo. Pedagogia de autonomia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.
HARARI, Yuval Noah. Sapiens – uma breve história da humanidade. Porto Alegre:
L&PM, 2015.